domingo, 13 de setembro de 2015

Às minhas fãs somente

Guian de Bastos e Guilherme Purvin lançaram recentemente o quarto volume da série Velho Império sem Czar. O título é Às minhas fãs somente. O livro inclui, como bônus, A turminha do Sacomã.

às minhas fãs somente

Esta é a sinopse fornecida pelos autores:

4º volume da saga "Velho Império sem Czar", o romance "Às minhas fãs somente" constitui a versão de Mirna Faras Alnabi e sua fiel escudeira Daiane Kelly sobre as causas e consequências dos trágicos acontecimentos ocorridos naquela fatídica noite de XI de Agôsto de um ano qualquer do distante Século XX.

Na minha opinião, é o livro mais divertido da série até agora.

Um aspecto que eu gostaria de destacar é que os livros não precisam ser lidos na ordem em que foram lançados. Pode-se lê-los em qualquer ordem. O quarto livro pode ser adquirido na Amazon, aqui.

Após o lançamento do segundo livro da série Velho Império sem Czar eu escrevi uma resenha para a série, que foi publicada no terceiro livro da série. Acho que esta é uma boa ocasião para postar essa resenha aqui. Vou mudar de fonte para dar destacar melhor o texto:

A série Velho Império sem Czar, criada por Guian de Bastos e Glautúrnio Polenta, radicaliza a estrutura narrativa estilo Rashomon: em vez de apenas quatro pontos de vista diferentes, a mesma – mas será que é realmente a mesma? – história é narrada a partir de oito pontos de vista. Cada um dos componentes da banda Velho Império sem Czar (Flamínio, Aguirre, Fred, Mirna, Ruth, Soraya, Desiratta e Guedes) narra, em seu estilo próprio, os fantásticos acontecimentos de uma semana em São Paulo, em um mês de agosto de um ano incerto deste mesmo século, quando membros e simpatizantes da O., uma organização em defesa da causa ambientalista, preparam-se para enfrentar as tenebrosas falanges da agromáfia. Entremeados a esses acontecimentos, há outros eventos narrados em flashback, que remetem a um ano qualquer do século passado, quando esses oito personagens eram ainda estudantes. Entre muitas outras peripécias, há um assassinato, sequestros, metamorfoses, um disco voador, grandes paixões e longas reuniões políticas.

Após o primeiro volume, A Batalha das Libélulas, narrado sob o ponto de vista de Flamínio Formica, segue-se este segundo, intitulado A Queda de Babilônia, apresentando a versão de Aguirre Lousada. O leitor da série talvez se sinta, como me senti, mais à vontade com este segundo livro, não apenas porque já conhece, em certa medida, os eventos narrados, como porque já está mais familiarizado com o estilo da narrativa. Em A Queda de Babilônia há mais interação entre os personagens – Aguirre está sempre conversando com Soraya, Valquíria ou algum outro amigo, o que ajuda o leitor a captar melhor as diferenças de psicologia ou comportamento das diversas personagens. Diferentemente do primeiro livro, centrado em Flamínio – que se mostrava, como o próprio Flamínio, mais volúvel, irrequieto e voltado para a ação –, este livro centrado em Aguirre é mais intimista, refletindo as dúvidas e inseguranças do personagem. Até este ponto da série, os autores souberam trabalhar os diferentes pontos de vista de forma magistral. Temos, assim, uma espécie de polifonia fragmentada, em que, a cada livro, uma das vozes se sobressai e dá o tom da narrativa, enquanto as demais se ocultam.

Não é fácil escrever uma resenha tradicional para uma série nada convencional. Principalmente porque há um fator que torna essa tarefa quase impossível para mim. É que… eu estava lá. De certa forma. (Não sei bem qual.) Não, não creio que eu seja personagem dessa série, mas, de alguma forma, Guian e Glautúrnio estão retratando o ambiente em que vivi durante meus anos de juventude, em determinado ponto do século passado. Reconheço não apenas vários cenários e acontecimentos, mas partes de diálogos e pensamentos. Então eu falo de um ponto de vista privilegiado, e posso dizer que os autores criaram uma narrativa a partir de elementos retirados do “real”, mas distorcidos de modo peculiar. Em suma: a Valéria não é bem a Valéria, e talvez nem seja mesmo a Valéria. O Bar do Ernani não é bem o Bar do Ernani, se é que vocês me entendem, e nem mesmo o Aphrodite’s Child é o Aphrodite’s Child que vim a conhecer na minha adolescência. Há, é claro, referências que não reconheço – e são muitas. A série não deixa de ser um grande quebra-cabeças – muito divertido e muito divertidamente enigmático. Algumas peças com certeza acabarão se encaixando ao final da série, mas outras provavelmente teimarão em permanecer “inencaixáveis”.

Poder-se-ia falar, talvez, em surrealismo – que é, sem dúvida, uma das influências no trabalho de Guian e Glautúrnio. O surrealismo de um Kurt Vonnegut Jr., Douglas Adams ou mesmo Kafka, em que conseguimos discernir elementos do real e que às vezes nos fornece um retrato mais fiel da realidade do que o mais obstinado realismo. Só que essas palavras – “fiel”, “realidade”, “realismo” – deveriam vir entre aspas, pois há muito – desde Freud, Nietzsche e Marx, ou talvez desde Kant – aprendemos a desconfiar dessa tal “realidade”. Nada mais contemporâneo do que essa sensação de estranhamento diante do mundo, que se reflete no próprio discurso. Nesse sentido, a série Velho Império sem Czar é uma obra radicalmente contemporânea (distópica, apocalíptica, anárquica), que lida com o absurdo com muita naturalidade e quebra expectativas com a mesma alegria com que os gregos quebram pratos nos restaurantes – com certeza ao som do Aphrodite’s Child.

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